quarta-feira, 4 de abril de 2012

Falta de investimento no tratamento de esgoto é uma das causas para sabor e cheiro ruins da água na Capital

O verde que tomou conta do Guaíba nos últimos dias esconde um problema que não deve ter solução a curto prazo.

Além de fatores climáticos e ambientais, especialistas apontam a falta de investimento em saneamento nas últimas décadas no Estado como uma das causas da proliferação do micro-organismo que deu gosto e cheiro à água dos porto-alegrenses. Para eles, o fenômeno deve voltar a ocorrer ao longo dos próximos anos.

A alteração é fruto da multiplicação da cianobactéria, a partir de uma conjugação de fatores como elevação da temperatura e calmaria no Guaíba. O que potencializa essa disseminação são nutrientes como o fósforo, presente no esgoto que desemboca no estuário e nos rios que compõem sua bacia.

Para ilustrar o que vem ocorrendo, o coordenador do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, Carlos André Bulhões Mendes, usa a representação de um prédio com 30 andares e dezenas de apartamentos. Imagine que cada um desses apartamentos produza seus resíduos.

Considere que todo esse esgoto seja despejado em um único lugar, no apartamento térreo do zelador. Pois esse zelador seria o Guaíba, que recebe, além do esgoto não tratado da Capital, as águas carregadas de dejetos produzidos nas cidades, indústrias e lavouras que ficam às margens de rios como Jacuí, Sinos e Gravataí.

— Isso vai se repetir pelos próximos 30 anos. É certo, e não preciso de supercomputadores para saber disso, pois não está havendo investimento suficiente em tratamento de esgoto — avalia Mendes.

Diretor de Recursos Hídricos da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Marco Mendonça reconhece a carência de informações sobre os recursos hídricos gaúchos. Ele afirma que até o ano que vem o Plano de Bacias do Lago Guaíba deve estar concluído, identificando fontes poluidoras e as ações necessárias.

Nos próximos meses, devem ser instaladas estações de monitoramento em 294 pontos no Estado, parte do Plano Nacional de Qualidade da Água.

O problema se espalhou para a região central da cidade

O professor de tratamento de água e esgoto da UFRGS Antônio Benetti cita o exemplo de Estocolmo, capital da Suécia, considerada uma das cidades mais insalubres do mundo no início do século 20 e que hoje é exemplo de sustentabilidade:

— A solução requer controle da poluição das cidades e das indústrias e do que é trazido quando chove lavando os campos, levando fertilizantes.

Enquanto o cenário permanece inalterado, o trabalho em Porto Alegre ocorre em duas frentes. De um lado, o investimento no Programa Integrado Socioambiental (Pisa), que deve ampliar o tratamento do esgoto produzido na cidade.

De outro, a batalha travada pelo Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) para tornar potável a água do estuário. As zonas mais atingidas pelas algas são as abastecidas pelas estações da Tristeza e do Menino Deus.

Mas por que o cheiro e o sabor persistem?

— Essas algas lançam duas substâncias para se defenderem de outras, o MIB (metil-isoborneol) e geosmina, responsável pelo cheiro de terra da água agora. Usamos o dióxido de cloro para neutralizar essa bactérias e o carvão como esponja para retê-las, mas o odor e o gosto normal da água podem ser alterados — explica Renato Rossi, diretor da Divisão de Tratamento de Água e Esgotos do Dmae.

Fonte: Zero Hora